Frei Simão

- José Lencastre -

1939

 

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Acabou a ceia e, antes de levantar a mesa e a toalha, o avô, o chefe da casa, pediu ao, hóspede que desse graças a Deus, o que ele agradeceu, declinando essa honra no ancião, que era o mais velho a por isso o mais respeitável. Assim se fez e o bom velho principiou a pedir por todos os santos do seu conhecimento, pelas pessoas falecidas da família a dos amigos, pelas almas do Purgatório e ainda por aquelas que não têm na terra quem se lembre delas; pelos que andavam nas águas do mar, que Nosso Senhor os trouxesse a porto de salvamento e, por último, a "Nossa Senhora das Preces que era nossa vizinha, que fosse nossa Madrinha perante seu amado Filho, quando deste mundo partíssemos ".


Emfim, uma reza que durou uma hora bem puxada. Os novos já cabeceavam com o sono. Benzeram-se a acabou tudo pelo peditório da bênção de mãos estendidas. E o «Deus to faça um santo o reboou em cruz com a mão estendida, dos velhos para os novos.


Principiou o serão: as mulheres fiavam grossas rocadas de estopa e linho, fazendo rodopiar nos dedos o fuso de pau, os homens debulhavam as últimas espigas de milho e o avô ensarilhava as maçarocas de fio que iam saindo dos fusos.


O hóspede olhava com curiosidade para aquela vida simples a abençoava aquele viver patriarcal. Depois do vendaval que o tinha martirizado, a naquele conchego morno do lar, veio-lhe a lassidão do sono.


Um enxergão de estopa grossa, cheio de palha centeia, foi posto em cima de uma arca, um lençol de linho, muito lavado, cobertores de lã cardada, fiada a tecida em casa, e ficou pronta a cama para êle. Derãm-lhe as boas-noites, desejando-lhe uma feliz, e o nosso caminheiro, depois das rezas, estendeu-se ao longo da roupa e, pouco depois, dormia profundamente. As canseiras, talvez da longa viagem e o aspérrimo tempo, provocaram-lhe aquêle sono profundo.

 

Levantou-se ao luzir do postigo. Pediu que o conduzissem à ermida a lhe dessem um ajudante, pois is celebrar Missa.
Foi então que os serranos hospitaleiros souberam que albergaram em sua casa um padre. Ora, este padre chamava-se, segundo êle disse, António Simão Correia, ninguém sabendo de onde vinha nem quem era.
Avistou-se com o cura de Aldeia das Dez, com quem muito falou, dizendo este lacónicamente aos seus paroquianos:


- Estimem-no que é um bom.


Ali principiou a exercer o seu ministério e a engrandecer o santuário com obras de arte. A sua fama de santidade espalhou-se por longe a viam-se, vir peregrinos de terras distantes, pedirem remédio para o corpo e para a alma. Para o corpo, fazia-os ajoelhar ante a imagem da Virgem a ali juntavam as preces, pedindo a saúde; para a alma, fazia-lhes exortações aconselhadas pela sua fé. E foram tantos os pobrezinhos que levaram saúde para Õ corpo a consolações para a alma, que difícil seria contá-los.
Ali vivia na casa ao lado da, igreja, no quarto que ainda hoje tem o seu nome, o quarto do Simão, tendo ali as sua vigílias e desfiando as suas penitências.

 


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